21 de jan. de 2018

OS RABINOS E A PROGRAMAÇÃO DOS GOLEMS.





(Do blog com equipe) - Dos monstros da antiguidade aos ciclopes da Ilíada, passando pelos autômatos e outras máquinas mecânicas da Idade Média (há um divertido romance histórico - “A Máquina de Xadrez”, de Robert Löhr - sobre isso), e pela peça R.U.R - Rossumovi Uiverzálni Roboti- (Robôs Universais de Rossum) na qual o escritor tcheco Karel Capek cunhou o termo robot, de 1921, o homem sempre sonhou com seres e máquinas que o obedecessem cegamente.

Em alguns casos, chegou-se a antever até mesmo alguma espécie de relação entre a escrita e o movimento, séculos antes que se pensasse na possibilidade de programação matemática e alfanumérica de máquinas.

Sobre isso há um interessante exemplo no folclore judaico, em que a escrita dá vida a um ser mítico  ligado à Cabala e à tradição mística do judaísmo.

O termo Golem, que, no Talmud, serve para se referir a um embrião ou substância incompleta - o salmo 139:16 usa a palavra “gal´mi”, significando “minha substância ainda informe” designa um ser inanimado, feito - como os soldados do Exército de terracota do Imperador Chi - de barro, que pode ser “ligado” ou “desligado” mudando-se simplesmente a palavra que está escrita em sua testa ou que está gravada em uma placa de cerâmica (pensamos imediatamente em um chip) colocada dentro de sua boca.

Embora hoje sejam mais conhecidos como personagens de jogos de computador, um dos mais conhecidos relatos de golems conta a estória de um rabino chamado Elias Balschem, que teria construído e destruído um desses seres no fim dos anos 1600.

Mais tarde, em meados do século XIX, essa narrativa é retomada com outro personagem, um rabino chamado Judah Loew, de Praga, que teria criado um golem também no século XVII, para defender o gueto de Josefov contra pogroms e atentados contra judeus praticados pela população local.

A primeira versão publicada dessa estória apareceu em 1847 em uma coleção de contos judaicos intitulada Galerie der Sippurim, publicada por Wolf Pascheles, e a segunda cerca de 60 anos mais tarde, em um conto de Yudl Rosenberg, em 1909.

De acordo com a tradição, esse golem teria sido feito, seguindo rituais específicos, com argila do rio Moldava.

Depois de modelá-lo, o rabino fez com que ele ganhasse vida recitando um encanto especial em hebraico e escrevendo na sua testa a palavra “emet”, que significa “verdade”.

À noite, o golem obedecia ao rabino, ajudando-o a proteger o gueto judaico, e durante o dia o rabino o escondia no sótão de uma sinagoga.

Porém, o monstro cresceu – os golems têm a propriedade de aumentar de tamanho absorvendo a terra do solo por onde passam - e tornou-se violento, começando - como o excluído monstro do Dr. Frankenstein de Mary Shelley - a atacar indiscriminadamente as pessoas. 

A população de Praga prometeu então ao rabino que a violência contra os judeus cessaria se o golem fosse destruído.

O rabino Loew aceitou o acordo e deu fim à sua criação apagando a primeira letra da palavra “emet”, “verdade”, restando apenas “met”, que significa “morte”, na testa do golem, o que o transformou em terra novamente.

Quem sabe, perguntamos, em uma espécie de alerta figurado sobre uma certa pretensa ingenuidade judaica, a morte do Golem do rabino Loew não tenha condenado os judeus da Europa à violência e ao genocídio que atingiram seu ápice com o pavoroso holocausto hitlerista?

Durante o qual, com certeza, muitas crianças que conheciam essa estória devem ter rezado e sonhado muitas vezes, em Riga, Lodz, Terezin e Auschwitz e em outros guetos e campos de concentração da Europa, para que seu Adonai particular lhes mandasse um exército de golems para destruir seus carrascos e captores nazistas?

Em tempos de Trump, da defesa da transferência, por conservadores, da capital de Israel para Jerusalém, de “bots”, botsnets e de outros programas de inteligência artificial que disseminam “fakes”, mentiras e pós-verdades, a serviço, principalmente,  da direita e do fascismo, será que todos nós - goys e judeus - não mereceríamos, caso orássemos, a volta de um golem poderoso e justo, que, com o vocábulo Emet novamente escrito na testa, nos restituísse o equilíbrio, a razão e a verdade?

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